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Choosing Wisely(Escolhendo sabiamente) e Slow Medicine(Medicina sem pressa)

Dois movimentos mundiais na área médica têm fornecido informações qualificadas para os pacientes contribuindo para uma discussão saudável sobre os excessos de procedimentos na medicina. O Chossing Wisely( no Brasil traduzido como “escolhendo sabiamente”) surgiu nos Estados Unidos em 2012 e o Slow medicine ( No Brasil “medicina sem pressa”) surgiu na Itália em 2002.

O primeiro artigo abordando o tema “slow medicine” foi publicado em 2002 pelo médico italiano Aberto Dolara, e foi publicado em uma revista de cardiologia.

Basicamente os dois movimentos defendem que as sociedades médicas assumam uma atitude pro ativa em fornecer informação baseado em evidências científicas para os pacientes. O Choosing wisely defende que as sociedades médicas de especialidades divulgue cinco condutas médicas(exames/procedimentos) que não devem ser realizadas de rotina. A função básica destes comunicados é diminuir intervenções desnecessárias baseado em evidências científicas robustas já disponíveis sobre determinada conduta ou intervenção médica. No Apple store e na Google Play existe um aplicativo grátis que contém todas as recomendações do Choosing Wisely americano, conteúdo um arquivo para médicos e outro para pacientes. Várias sociedades já publicaram suas recomendações e é impressionante a quantidade de condutas que foram mudadas na última década, após conclusão de vários estudos randomizados. É crucial que os pacientes e médicos estudem estas recomendações para que paradigmas estabelecidos há muitos anos possam ser quebrados. Para citar apenas dois exemplos que confrontam o senso comum e as condutas que eram recomendadas no passado: não há recomendação para realizar eletrocardiograma de rotina em pacientes com baixo risco cardíaco que irão se submeter a tratamento cirúrgico; exame de papanicoloau para rastreamento do câncer do colo do útero deve ser realizado somente a cada três anos dos 30 aos 65 anos de idade. Somente nestes dois itens soma importante de recurso podem ser poupadas além de um menor estresse para o paciente.

No site da Choosing Wisely Brasil encontramos recomendações da Sociedade Brasileira de Cardiologia, Endocrinologia e Metabologia e Sociedade Brasileira de Medicina de Família e Comunidade, mas é um movimento crescente e em breve nossas recomendações de outras sociedades médicas devem ser incluídas.

Já o movimento Slow Medicine defende o regaste de uma medicina centrada no ser humano. No Brasil existe um grupo de médicos envolvidos com a divulgação deste conceito. Um site foi construído e o movimento, embora incipiente, começa a ganhar corpo, inclusive com eventos científicos focados neste tema. Acesse o site slowmedicine.com e tenha mais informações.

O número de publicações na literatura tem aumentado, em fevereiro de 2018 utilizando o unitermo “Choosing wisely” havia 540 artigos publicados na base Pubmed, que é uma das bases mais utilizadas pelos médicos para pesquisa de artigos científicos.

Choosing Wisely da Sociedade Brasileira de Mastologia

Algumas Sociedades Médicas de Especialidade no Brasil já divulgaram seus 5 procedimentos ou intervenções que não são recomendadas. A Sociedade Brasileira de Mastologia enviou por e-mail em 2017 para os mastologistas sócios da SBM um questionário com 20 recomendações iniciais para que fossem votados, e os 5 mais votados foram publicados como as recomendações do Chossing Wisely da SBM. Foram obtidos 362 votos totais. A s recomendações em ordem decrescente de votos foram:

  1. Não indique rotineiramente mastectomia contralateral redutora de risco em mulheres com câncer de mama primário, sem mutações genéticas ou sem história familiar fortemente sugestiva de câncer de mama hereditário – não existem estudos que comprovem benefícios em submeter uma paciente a mastectomia redutora de risco como prevenção primária do câncer de mama quando a mesma não comprovar mutação genética ou quando a história familiar não for fortemente sugestiva de câncer de mama hereditário. Muitas mulheres tem a impressão de diminuir o risco da doença e aumentar sua chance de cura ao se retirar a mama contralateral, mas o médico deve informar muito bem à paciente que não existem estudos até o presente momento que mostrem alteração na sobrevida global nas pacientes de risco habitual com esta cirurgia.
  2. Não indique rotineiramente mastectomia em pacientes que possam ser submetidas a cirurgia conservadora de mama – Diversos estudos já comprovaram que as pacientes submetidas a abordagem conservadora da mama seguida de radioterapia, apresentam as mesmas taxas de sobrevida livre de doença, sobrevida global e recidiva local em relação as pacientes submetidas à mastectomia.
  3. Não reopere rotineiramente pacientes com câncer de mama invasivo e margens livres, mesmo quando as margens estiverem próximas da bordas excisadas – Estudos publicados já evidenciaram que não há diferenças nas taxas de recidiva local em pacientes com tumor invasivo muito próximo a borda da ressecção quando comparadas as taxas de recidiva com margens mais amplas. A re-excisão deve ser feita apenas onde as margens são comprometidas na avaliação anatomapatológica.
  4. Reflita muito antes de solicitar teste para pesquisa de mutações em mulheres com câncer de mama sem história familiar compatível com câncer de mama hereditário – Os testes são indicados para pacientes selecionadas, sendo que em nosso país eles fazem parte do roll de procedimentos da ANS, quando solicitados por um geneticista. Não temos estudos mostrando benefícios na solicitação rotineira desses testes. Eles não devem ser solicitados em pacientes cujo o resultado não influenciará na tomada de decisão do tratamento.
  5. Não solicite rotineiramente ressonância magnética ou biópsia percutânea em pacientes com lesões BIRADS 3 – Em caso de lesão BIRADS 3, a solicitação de ressonância magnética deve ser indicada quando os exames de imagem( mamografia/USG de mama) forem inconsistentes com o exame físico. A solicitação rotineira de RM pode aumentar biópsias desnecessárias, atrasar o tratamento e aumentar os custos na saúde. Quanto a biópsia, está bem estabelecido que a lesão deve ser seguida com acompanhamento a cada 6 meses até completar 2 anos de seguimento, pelo método de imagem que melhor caracteriza a lesão, não havendo a necessidade de submeter uma paciente a procedimento invasivo.

Não existem dúvidas de que estes movimentos são necessários e importantes, diante do cenário em que vivemos em termos de tecnologia e exigência da população, cada vez mais informada. É comum se ouvir durante as consultas de rotina a solicitação para realização de todos os exames possíveis por parte dos pacientes. No entanto, é notório que existe indicação de exames e cirurgias em excesso em nosso meio. É um assunto pouco abordado nas publicações científicas, e as universidades brasileiras devem incluir este tema em seus programas de pós-graduações para que possamos quantificá-lo, identificar as causas e propor soluções.

A realização de exames e cirurgias desnecessárias leva a sofrimento, morbidade e risco de morte para os pacientes. Além do custo financeiro num país onde os recursos são escassos.

A posição defensiva adotada pelos médicos na solicitação de exames em excesso tem como causas o aumento dos processos contra médicos e provavelmente também a piora na formação científica do médico nas últimas décadas, além do desenvolvimento tecnológico da medicina. A solicitação de exame deixa o médico mais tranqüilo, pois fez tudo que era possível e o paciente geralmente fica satisfeito por ter suas demandas atendidas, principalmente quando o mesmo é usuário do SUS ou da saúde suplementar, sem co-participação. No entanto, quando o paciente é responsável pelo pagamento integral ou tem co-participação no seu plano de saúde é freqüente o mesmo questionar se realmente são necessários todos os exames solicitados.

Choosing Wisely da SMP/PI

A SBM regional Piauí, elaborou um consenso que incluiu várias recomendações do que não deve ser realizado de rotina8. E acompanhando a tendência adotada por outras sociedade médicas internacionais elencou 12 recomendações, ou invés de cinco:

  1. Não solicitar de rotina ressonância magnética de mamas em pacientes com diagnóstico de carcinoma invasor – os dados existentes não suportam esta conduta. A ressonância esta associada à maior taxa de mastectomia e não impacta na sobrevida.
  2. Não esvaziar a axila em paciente com até 2 linfonodos comprometidos no tratamento conservador do câncer de mama que irão receber radio e quimioterapia – o esvaziamento axilar neste cenário não aumenta sobrevida e está associada a mais complicações no braço (linfedema, parestesias )
  3. Não reoperar pacientes com carcinoma invasivo que apresentem no exame histopatológico final tumor na tinta (considerar margem livre independente do tamanho da margem)
  4. Não solicitar de rotina ultrassonografia de abdome, radiografia de tórax,tomografias, cintilografias ou PET/CT em pacientes com câncer de mama em estádio I e II,independente do subtipo molecular,se assintomáticos – os exames devem ser solicitados de acordo com sinais ou sintomas específicos, ou se TGO, TGP e fosfatase alcalina alterados
  5. Não solicitar de rotina exames no seguimento de pacientes tratadas com câncer de mama com intenção curativa que estejam assintomáticas( ultrasonografia transvaginal, ultrassonografia de abdomen, radiografia de tórax, cintilografia,PET/CT, marcadores tumorais). Realizar somente mamografia anual, sendo a primeira seis meses após término da radioterapia – não existem dados que mostrem que o diagnóstico precoce da metástase por exames de imagem/laboratório aumente a sobrevida, além de piorar a qualidade de vida pela realização de exames freqüentes e intervenções desnecessárias como biópsias e cirurgias
  6. Paciente em uso de tamoxifeno não deve realizar ultrassonografia transvaginal de rotina, se assintomáticas – realizar ultrassonografia transvaginal de rotina em usuárias de tamoxifeno leva ao aumento de biópsias endometriais e histeroscopias sem impactar na sobrevida e piorando a qualidade de vida das pacientes.
  7. Não solicitar assinatura genética de rotina para todas as pacientes com câncer de mama – assinatura genética deve ser solicitada quando o benefício da quimioterapia não é claro.
  8. Não realizar de rotina mastectomia bilateral em pacientes com câncer de mama unilateral na ausência de mutação genética patogênica – não há evidência que esta intervenção diminua a mortalidade
  9. Não realizar de rotina mamografia em pacientes com menos de 40 anos com exame físico normal e sem história familiar de câncer de mama
  10. Não realizar de rotina ultrassonografia das mamas em pacientes assintomáticas com menos de 40 anos
  11. Não realizar mastectomia profilática bilateral em pacientes que não foram testadas para mutações genéticas
  12. Não realizar mastectomia profilática bilateral em pacientes com testes genéticos negativos para mutações deletérias de alto risco

Choosing Wisely da Sociedade Brasileira de Medicina da Família e Comunidade

Para finalizar este capítulo colocamos abaixo as recomendações da SBMFC, por entendermos que todos os médicos devem ter um conhecimento geral do que não deve ser aplicado para a maioria da população:

  1. Não fazer de rotina PSA ou toque retal para rastrear câncer de próstata
  2. Não prescrever inibidor de bomba de prótons continuamente
  3. Não solicitar exame de vitamina D em adultos de baixo risco
  4. Não solicitar exame de sangue anual de rotina exceto se indicado pelo risco individual
  5. Não prescrever antibióticos para infecções respiratórias superiores que têm alta probabilidade de ser viral
  6. Não solicitar mamografia de rotina para mulheres de baixo risco entre 40 e 49 anos
  7. Evitar uso de benzodiazepínico em pacientes com história de abuso de substância (incluindo álcool) ou uso de múltiplas medicações psicoativas
  8. Não fazer exame físico anual em adultos assintomáticos sem fatores de risco significativos
  9. Não fazer ultrassom ou testes funcionais da tireóide de rotina em pacientes assintomáticos
  10. Não fazer densitometria óssea em pacientes de baixo risco
  11. Não fazer eletrocardiograma anual ou outros rastreamentos cardíacos em pacientes de baixo risco
  12. Não rastrear paciente de baixo risco cardiovascular (risco absoluto <10% em 5 anos) com eletrocardiograma, teste ergométrico ou outro teste de estresse, escore de cálcio coronariano ou ultrassom de carótida
  13. Não agendar trabalho de parto ou cesárea eletiva em gestantes antes de 39 semanas de gestação sem indicação médica clara
  14. Não sugerir auto-monitoramento de glicemia capilar para diabético tipo 2 em uso apenas de medicação oral
  15. Não prescrever antibióticos para sinusite leve ou moderada exceto se os sintomas estiverem presentes por 7 ou mais dias
  16. Não solicitar teste ergométrico de esforço de rotina ou para pacientes sem fatores de risco que fazem atividade física recreativa
  17. Não fazer exame de imagem para lombalgia antes de 6 semanas exceto se houver sinais de alarme
  18. Não fazer uretrocistografia miccional rotineiramente após a primeira infecção de trato urinário em crianças entre 2 e 24 meses
  19. Não rastrear estenose de carótida em adultos assintomáticos
  20. Não rastrear câncer de colo em mulheres com mais de 65 que já tiveram outros rastreamentos normais e não tem risco elevado de câncer de colo de útero
  21. Não rastrear escoliose em adolescentes
  22. Não fazer papanicolau em mulheres que fizeram histerectomia por algum motivo que não seja câncer ou com frequência maior que a cada 2 ou 3 anos
  23. Não iniciar tratamento para hipertensão ou dislipidemia antes de avaliar o risco cardiovascular global
  24. Não exigir exame físico para prescrição de anticoncepcional oral

Outras Recomendações que não devemos realizar de rotina em pacientes assintomáticos

  1. Ultrassonografia de tiroide (aumenta o risco de procedimentos desnecessários como punção e cirurgias)
  2. Ultrassonografia transvaginal (aumenta o risco de cirurgias desnecessárias, sem aumentar a sobrevida das pacientes. Não existe exame para rastreamento do câncer de ovário, infelizmente)
  3. Ultrassonografia de abdome (aumenta o risco de intervenções desnecessárias)
  4. Videocolposcopia de rotina (aumenta intervenções desnecessárias)
  5. Papanicolau todos os anos, é suficiente realizar a cada três anos
  6. Endoscopia digestiva alta
  7. Colonoscopia em pacientes com menos de 50 anos, exceto em casos de câncer colo retal em parentes de primeiro grau em que o diagnóstico tenha ocorrido antes dos 50 anos
  8. Densitometria óssea anual
  9. Cirurgia para endometriose sem antes tentar tratamento clínico com medicações. O dienogeste oral, uso contínuo, apresenta altas taxas de respostas evitando cirurgias.
  10. Cirurgia para mioma é exceção. A maioria não carece de nenhuma tratamento e na menopausa geralmente regridem de tamanho.
  11. A maioria dos cistos de ovários não precisam ser operados. Em caso de cistos grandes e sintomáticas pode ser tentado o esvaziamento guiado por ultrassonografia.
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